COMPLIANCE, IMPERIALISMO E A FIFA

Por Danilo Rizzo – "Para mim, trata-se claramente do seguinte: são os EUA mobilizando seu aparato legal interno em prol de questões geopolíticas. No caso, para colocar pressão na Rússia, com quem o país tem tido problemas recentemente, e no Qatar, onde também existem questões geopolíticas". Essas palavras não são minhas, mas do professor John Shulman, sobre a ação do FBI contra a FIFA.
Minha opinião não se importa com essas supostas questões geopolíticas. O conflito entre os Estados Unidos e a Rússia eu conheço, mas quais questões geopolíticas em relação ao Qatar podem ter motivado essa ação? O petróleo? Os norte-americanos tem manejado muito bem a questão do ‘ouro negro’, comprando de Canadá e México, e aumentaram sua produção interna. Talvez uma tentativa de controle dos preços do produto? Pode ser, mas isso também afetaria seus parceiros e produtores nacionais. Li que a ação dos Estados Unidos foi ‘imperialista’ e ‘de dominação’. Provavelmente quem escreveu isso deve acordar, todos os dias, ansioso para ler os jornais, esperando que ressurja a guerra fria. Pobres coitados que não perceberam que essas tensões acabaram e que o lado que escolheram saiu derrotado; que a mãe Rússia entregou os pontos e hoje é lar de algumas das maiores fortunas pessoais do mundo; e que Cuba esta de joelhos pedindo ajuda aos ‘imperialistas’ e ‘opressores’, porque o projeto de país ruiu. A utopia virou distopia, mas não percebem. Prefiro crer que a blitz sobre a entidade máxima do futebol não tem como foco a própria FIFA, mas seus parceiros, conglomerados comerciais que dominam mercados, e que operam nos Estados Unidos. Qualquer discurso em contrario é querer desqualificar a acusação sem análise de fato. Penso que o fulcro dessa operação passa bem perto de algo que já escrevi: ética e o compliance.
Vamos refrescar nossa memória. Ano passado a Copa do Mundo foi realizada aqui e parte de nós se opôs a realização desse evento. Os legados da Copa não vieram. A FIFA passou por cima de algumas de nossas leis – como a de proibição da venda de bebidas alcoólicas nos estádios – e teve isenção irrestrita de impostos. Ficou claro que ela só se associa quando se via livre dos mecanismos formais de prestação de contas que são utilizadas para segurar às organizações internacionais a responsabilidade para seus próprios objetivos. Ideia aplicável também a seus patrocinadores, que se beneficiam significativamente desse relacionamento. Ficou demonstrado que, essencialmente, a FIFA não se submete a hierarquia e a ferramentas de fiscalização, e ignora a responsabilidade fiscal e regulamentar. Até então, quaisquer esforços para reformar a FIFA a partir de dentro ou como consequência da pressão dos governos, o público, a mídia ou organizações de fiscalização, não foram suficientes para resultar diretamente em qualquer mudança significativa.
Imagem: sergiorochareporter.com.br
As confissões de culpa de Chuck Blazer, José Hawilla, Darryl e Darryan Warner serão bastante úteis e certamente representam uma nova era, mas ainda faço uma pergunta: Por que demorou tanto tempo? Tais acusações sugerem atividades criminosas que se estenderam ao longo de 21 anos. Se se trata de algo tão cultural da entidade, por que nenhum patrocinador tomou medidas para distanciar-se ou até retirar-se desse ambiente? E será que essa anuência das empresas não é motivo suficiente para a atuação do FBI?
A atenção da mídia, em particular, tem o potencial para manter a reforma FIFA na agenda pública e política e no processo de conferir algum grau de benefício percebido para os políticos e empresas que decidirem abraçar a causa. A revelação de novos escândalos – como a renúncia do presidente recém-eleito - irá sustentar essa atenção, mas, na sua ausência, a atenção é suscetível de diminuir. Aí está o papel da mídia no compliance. Talvez esse foco finalmente servirá de estímulo para os patrocinadores da FIFA polirem suas próprias credenciais, relações comerciais e programas de compliance, e para que as autoridades suíças limpem um estábulo, negligenciado ao longo dos tempos.

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