IMPÁVIDOS

Por Danilo Rizzo - Nos últimos meses tenho direcionado meus pensamentos para o futuro, procurando inovações aplicáveis no espectro corporativo e, por que não, no ambiente familiar, na vida privada. Tentando não ser bidú, e me esquivando dos que assim se intitulam ou se apresentam, vou lendo muita coisa, descartando varias outras, e de alguma forma, minha visão vem clareando. E ao assistir a derrocada da seleção brasileira, em diversos momentos me vi diante de exemplos de como planejar e de como não planejar uma campanha. Vou me ater, neste artigo, a três tópicos: Passado; Futuro; e Comportamento.
foto: maisfutebol.iol.pt
Um dos equívocos mais comuns quando se está na etapa de planejamento de algo é projetar o que irá acontecer se baseando no que já aconteceu. Parece muito conveniente agirmos dessa forma, mas, via de regra, nada garante que o fato que nos fez tomar determinadas decisões, voltará a acontecer. No caso da seleção brasileira, claramente esse erro foi cometido. A comissão técnica baseou-se no desempenho do time na última Copa das Confederações, para não mudar absolutamente nada. A convocação para a Copa do Mundo repetiu 16 nomes que estiveram naquele torneio.
O passado, com parcimônia, pode compor parte de um planejamento. A seleção tedesca joga com a mesma base a cerca de 6 anos, e a comissão técnica sabia disso, tanto que teve a amarga experiência de perder para os germânicos, há 3 anos, em Sttutgart. Não por acaso, naquele confronto os gols alemães foram anotados por Schweinsteiger, Götze e Schürrle, e desse trio, dois estiveram em campo na última terça-feira.
E o futuro? Há Deus pertence? Peter L. Bernstein, em seu livro Desafio aos Deuses, diz que: “Sem números, não há vantagens nem probabilidades; sem vantagens e probabilidades, o único meio de lidar com o risco é apelar para os deuses e o destino.”. Quando não nos cercamos de dados e informações de qualidade, só o que nos resta é apelar para as divindades mesmo. Claro que prever que Alemanha e Holanda ganhariam com tanta facilidade seria muito difícil, e impossível pensar que os germânicos anotariam 5 gols na 1ª meia hora de jogo. Mas o pulo do gato é justamente estar preparado para esse tipo de contingência. Não que a campanha da seleção até então, mas o jogo demonstrou a eficiência do planejamento dos europeus face ao frágil improviso verde e amarelo.
Voltando ao tema ‘elenco’, quais opções a comissão técnica tupiniquim tinha quando se viu frente à lesão de Neymar? A resposta correta é: nenhuma. De fato, não há jogador brasileiro que substitua o #10, por isso mesmo é que deveria ter sido pensado num, ou em mais de um, plano de contingência. Neymar é caçado em campo, e isso é de conhecimento público. Logo, mais suscetível a lesões e contusões. Portanto, a probabilidade dele ter que ser substituído, temporária ou permanentemente, como aconteceu, era iminente, e claramente não havia um plano ‘b’. Outro bom exemplo é o fenômeno Fred. Foi eficiente na Copa das Confederações, homem de confiança do treinador, mas não esteve bem em nenhum jogo, nem por um minuto se quer no atual torneio. Será que isso também não seria previsível? A julgar pelo que o jogador não fez desde julho de 2013, entendo que sim. E a situação piora quando pensamos que seu substituto era o jogador Jô. Nada pessoal, mas ele é outro que teve bom desempenho no ano passado, mas pouco fez desde então.
Finalmente, e creio que mais importante que aos temas que já falei, vem o aspecto comportamental. Sempre critiquei algumas frases feitas que teimamos em usar, e uma delas é a tal “o Brasil é o país do futebol”. Até hoje não sei de onde tiraram isso, mas julgo que tenha sido pelos títulos mundiais e pela participação em todas as edições de Copas do Mundo. Ok, é um critério, mas me permita trazer duas novas estatísticas ao debate. Regionalmente estamos (muito) atrás de nossos vizinhos. O Brasil tem 8 títulos, contra 15 dos uruguaios e 14 dos argentinos. Outro dado é que também não temos a hegemonia de títulos nos torneios mundiais de jovens. Na Copa do Mundo sub-20, a Argentina é a maior vencedora com 6 conquistas, uma a mais que o Brasil. E nem vou trazer as estatísticas dos times campeões mundiais, pois o cenário é ainda menos favorável.
Meu bom senso me faz crer que, diante dessas informações, o Brasil não é o país do futebol, e impor aos
jogadores da seleção o compromisso de vitória, de forma a honrarem ‘o país do futebol’, é ligeiramente desumano. Colocar sobre os ombros de um grupo de 23 pessoas, todas as frustrações de um país continental, desequilibrado moral e economicamente, é sabotagem. Não podemos esquecer que esse grupo é constituído de jovens que passaram suas infâncias e juventudes aqui no Brasil, e por óbvio, não tiveram acesso à boa educação, não viveram em condições de saúde e saneamento ideais, e que enfrentaram problemas familiares e sociais comuns às classes menos favorecidas. Como cobrar equilíbrio emocional de pessoas que passaram por tantas dificuldades? Hoje vivem decentemente, mas algumas lacunas do passado são impreenchíveis. Quem cobrou deles, como resultado único aceitável, a conquista dessa Copa do Mundo, os sabotou.
Creio que chegar até esta fase do torneio é motivo de comemoração. Mas, friamente, após os massacres tedesco e holandês, já sei quem não ganhará nada nessa Copa. Citando novamente Peter Berstein: “A essência da administração do risco está em maximizar as áreas onde temos certo controle sobre o resultado, enquanto minimizamos as áreas onde não temos absolutamente nenhum controle sobre o resultado e onde o vínculo entre efeito e causa está oculto de nós.”. Se o Brasil tinha alguma coisa sob seu único e exclusivo controle, era o aspecto emocional da equipe, e justamente isso falhou.

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