MÚSICA E HISTÓRIA, EPISÓDIO 5 - A PRIMAVERA TUPINIQUIM EM TRÊS ATOS

Por Danilo Rizzo
1º ATO: Mentos com Coca-Cola


Quando rolaram os comícios das ‘Diretas Já’, minha maior preocupação era não decepcionar meus pais na, por vezes traumática, migração da frauda para o vaso sanitário. Uma década depois foi a vez dos ‘caras pintadas’ irem às ruas protestar contra o então presidente Fernando Collor, e minha maior preocupação era controlar o tsunami de hormônios da pré-adolescência... espinhas, voz afinada, efeito sanfona, baixa autoestima, etc. Veio a vida adulta, e com ela as ideologias politicas, que começaram a fazer realmente parte da minha vida, e o país engrenou, plano real, inflação e cotação do dólar em queda livre, exportações, investimentos, e também um cenário político calmo como poucas vezes se viu.
Pertenço àquela massa de pessoas nascidas no final ou após o regime militar rotulada de ‘geração Coca-Cola’, baseada na música de mesmo nome da Legião Urbana. O que de certa forma faz sentido, pois, até então, nenhuma outra geração usufruíra tanto das benesses da abertura para os produtos importados, tv a cabo, internet, e tantos outros ‘enlatados dos USA’ como diz a música. Esse cenário de ‘marasmo’ político e capitalismo soou a todos como falta de identidade, nacionalismo, mas parece que não é bem assim.
Nas últimas semanas temos presenciado atos populares ao redor do país, que começaram com a crítica ao aumento da tarifa de ônibus em São Paulo, mas tomou proporção e uma pluralidade de causas e reivindicações muito mais ‘importantes’ e profundas do que R$0,20. No início, quando vi manifestantes destruírem bancas de jornal, estações de metrô, bases da PM de São Paulo, confesso que questionei os atos, para mim, quem age com violência deixa de ter razão. Também vi bandeiras de partidos políticos, o que me fez questionar ainda mais essas manifestações. Será que o cunho é esse? Mas a coisa continuou, tomou corpo, as pessoas se identificaram com aquilo, ir para as ruas e criticar tudo o que está errado, dos R$0,20 da tarifa de ônibus aos bilhões da Copa. Começaram com alguns milhares de pessoas, e chegaram às dezenas de milhares. A polícia, por vezes exagerou, pois o povo decretou paz. Claro que há exceções, mas onde elas não existem? As ruas foram tomadas, caminharam às sedes dos governos locais, tomaram pacificamente o Congresso Nacional. E hoje, tudo está mais claro.

2º ATO: Que país é esse?


(Peço uma licença poética para postar o clipe da música é cantada pelo Capital Inicial, mas vale pelo discurso do vocalista Dinho Ouro Preto e o coro da galera)
Aparentemente a política está de fora de tudo isso, a ponto dos próprios manifestantes expurgarem qualquer simbolismo de partido político que faça parte dos grupos, mas entendo que, para que realmente tudo isso valha a pena, precisamos começar a pensar nela, na política. Vivemos um estado democrático de direito, logo, a maior forma de manifestar indignação, revolta e apoio, é através do voto. A próxima eleição se avizinha, 2014 está aí e exerceremos nosso ‘direito’ de escolher novos Presidente, Governador, Senadores, Deputados, e se de toda essa mobilização popular não surgirem lideres, opções reais de oposição ao que hoje está estabelecido, nos veremos face a face com os velhos candidatos daqueles partidos de mentirinha, aqueles que não nos representam, como bem disse o Ministro Joaquim Barbosa. Aliás, Joaquim Barbosa merece aqui um agradecimento, pois tenho para mim que aquele tapa na cara dado por ele, efetivamente nos acordou.
No último dia 19/06, o poder público reagiu a principal causa das manifestações, cedeu à pressão popular, e voltou atrás no aumento das tarifas do transporte público. Com isso, criou-se um paradigma, que abre as portas para novas manifestações. Motivos para continuarmos nas ruas não faltam, a PEC37, os investimentos na infraestrutura para Copa e Olimpíadas, e a consequente falta de investimentos em saúde, educação, transporte público, segurança, etc., a carga tributária, a corrupção... enfim, há muita coisa para protestar, e com o poder público pressionado, agora é hora de mostrar que país é esse!!!

3º ATO: A gente não somos inúteis


Depois dos acontecimentos de ontem (20/06) em todo o país, ficou claro que as lideranças precisam aparecer, não mascaradas ou usando capacete, mas de cara limpa, disposta e preparada para dialogar com os governos municipais, estaduais e federais. Registrou-se protestos em mais de 100 cidades, vários violentos, outros tantos absolutamente pacíficos, eu mesmo demorei 3h para chegar em casa pois as principais vias de acesso à cidade onde moro foram tomadas por diferentes manifestações, mas não vou reclamar, a causa é muito maior que só o meu bem estar. Mas a necessidade de organização apartidária dos movimentos é iminente, sob pena de tudo se perder, todo o esforço, toda luta, toda mobilização. Precisamos de um rumo agora, manter o caráter apartidário da coisa, tanto entre os manifestantes quanto nos alvos das críticas, continuar nas ruas, elencar novas reivindicações, expurgar qualquer ato de violência ou vandalismo, e exigir posicionamento do poder público, para que ninguém mais nos veja como inúteis, ou como a ‘geração perdida’.
Ouço desde que nasci que o Brasil é o país do futuro, e sinto que as gerações Coca-Cola têm essa ficha na mão. Portanto é dever de todos, de agora em diante, não permitir que nossa ‘Primavera Tupiniquim’ acabe num inverno chuvoso, cinzento...

Comentários

  1. É isso aí.....cenas dos próximos capítulos após o pronunciamento da presidente.....vamos ver se haverá articulação política suficiente para sair da crise e convencer o povo de algo prático será feito a curto prazo para mudar o atual cenário. Que o povo tenha juízo e paciência para mudar o rumo sem perder o estado democrático de direito, o que seria um grande prejuízo para a Nação.
    Alan

    ResponderExcluir

Postar um comentário